Já perdi os cálculos de quantas cartas comecei a compor unicamente na tarde passada, mas afirmo que muitas foram as que apenas começaram…
Meu bem querer, a um bom tempo não lhe escrevia achei que não fosse mais necessário e julguei, além disso, ser em vão. Quero escrever-te uma carta caprichada, repleta de corações aos pingos dos is, carregada de sentimento que lhe transmita toda a minha confiança a ti, abarrotada de vocativos doces e quem sabe até com alguns versos antigos de minha autoria feitos em um daqueles momentos de devaneios que me arrisco a ser poetisa. Meu bem querer queria ganhar-te nas palavras como você ganhou-me nos galanteios, nas constantes trocas de olhares e tantas coisas mais. Lembrei-me do quão mais enfático seria decorar todo o texto, que agora vos escrevo, e dita-lo pessoalmente, ora seria de um encanto magnífico, não? Para isso é imprescindível audácia que habitua sempre me falecer quando o contexto é você, contento-me apenas em escrever-te. Arquiteto que já me conheça de forma satisfatória, para saber que adoro bons floreios e aquele ar de suspense que antecede o verdadeiro alvo em questão; creio que já é do seu notar que não faria muito dessemelhante nesta carta certo? Certo. Escrevo-te agora com a maior objetividade, tentando poupar-te dos floreios que tu tanto odeia; Não era nem tarde nem noite, era meio termo, lembrando de ti peguei um papel desbotado meio amassado e minha caneta tinteiro, esforcei-me para caprichar na caligrafia e expus naquele mero pedaço de papel todo o meu eu interior, tinha a intenção de escrever sobre qualquer coisa boba que me viesse à tona, como o vento soprando forte e gelado, hora fraco e cordial ou sobre os pássaros que costumam vir na minha janela toda manhã para cantar uma simplória melodia e partirem após terem me despertado, mas falar disso é como quem permanece no labirinto mesmo sabendo qual é a saída, é capaz de compreender-me? Caso não entenda, faço questão de explicar detalhadamente; não posso falar sobre outra coisa se não você, a tua voz calma, teus meios sorrisos, e a cor da tua íris perfeita sob a luz do sol, por quê? Oras, porque tornei absolutamente tua sem que fizesse qualquer reivindicação para isto, porque não posso me perder falando sobre coisas banais quando a há todo um vendaval em mim que é você, ainda não compreende? Explico mais uma vez, eu não posso, eu não quero falar sobre nada que não seja a cor dos teus cabelos claros, ou sobre a tua boca rosada, sobre teu cheiro de roupa limpa. Aprendi desde cedo que a melhor coisa a ser feita quando não se pode falar é escrever, e com tempo enxerguei uma perfeição e certa tranqüilidade que só encontro quando escrevo sobre o que sinto, será que estou sendo claro o suficiente para ti? Explico-te quantas vezes forem necessárias… Não posso escrever sobre os pássaros que me fazem o convite a despertar toda manhã, nem sobre o vento gelado que me arrepia ao fim da tarde ou, por vezes, me aquece simplesmente porque eu não os sinto, apenas porque o que eu sinto de maneira forte, implacável e infinita é você. Você, você e mais algumas boas doses de você…

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